Apartamento para solteiros 'pobres' que ganham até R$ 4.344
24/06/14 08:51Um condomínio recém-lançado na Barra Funda (bairro da zona oeste) oferece apartamentos de 32 m² e um dormitório (ainda na planta) por R$ 185 mil reais. Trata-se, como o próprio anúncio do empreendimento deixa claro, de HIS (habitação de interesse social).
Em São Paulo, a renda familiar máxima permitida para HIS é de seis salários mínimos (R$ 4.344). O apartamento do anúncio tem um quarto só, ou seja, foi projetado para atender as necessidades de solteiros ou casais sem filhos.
Quando um imóvel desses é vendido a um solteiro no limite da faixa de renda permitida, o resultado é que uma política de interesse social atendeu um paulistano que faz parte dos 17,4% que estão no topo da pirâmide social.
Se considerada a renda familiar, a distorção, embora menor, ainda existe: 42,6% das famílias paulistanas têm renda igual ou maior do que seis mínimos.
A faixa de renda atendida por HIS foi estabelecida em 2002, pelo Plano Diretor vigente. Como o salário mínimo era então de R$ 200, HIS estava destinada a famílias com renda mensal de até R$ 1.200. Esse valor, corrigido, daria hoje R$ 2.610, pouco mais da metade dos R$ 4.344.
Resumindo, o salário mínimo se valorizou, e a distorção não foi corrigida na política habitacional.
A última redação (de 17 de junho) do substitutivo do Plano Diretor, que tramita na Câmara Municipal, avança na correção do problema, ao subdividir HIS em duas categorias.
A chamada HIS 1 garante que uma parte dos apartamentos atenda famílias que ganham até R$ 2.172 (três salários mínimos). A chamada HIS 2 atende até o equivalente aos mesmos seis salários mínimos de antes.
Mas, além da subdivisão, agora os empreendimentos de interesse social em regiões com boa infraestrutura (as chamadas Zeis 3) devem reservar ao menos 60% da área para a faixa mais baixa de renda, a HIS 1. No primeiro texto enviado a Câmara pela prefeitura essa proporção era de 25%.
(clique no quadro abaixo para ver em tamanho maior)
No plano de 2002, em que havia apenas uma faixa de HIS, a reserva para habitação de interesse social era de 40%.
Outra novidade do plano são as chamadas Zeis 5, situadas em regiões ainda mais bem estruturadas. Uma delas, por exemplo, fica na Vila Nova Conceição, um dos bairros mais ricos da cidade. Neste tipo de Zeis, a reserva é de 40% para HIS, mas sem distinção de faixas de renda 1 e 2.
O mercado já deixou claro que não tem interesse em construir em Zeis 3 e reclama que são poucos os terrenos para Zeis 5, diz o vereador Nabil Bonduki (PT), relator do plano na Câmara.
O risco portanto é a repetição do que ocorreu no último Plano Diretor, de 2002. Dos 1,1 milhão de m² dos 74 lotes demarcadas como Zeis no centro expandido, apenas 10% receberam empreendimentos da iniciativa privada. E tudo isso em meio a um boom imobiliário sem precedentes.
Para João Whitaker, pesquisador sênior do laboratório de habitação da FAU-USP, os imóveis para HIS acabam sendo destinados à classe média, e as políticas de habitação na cidade não são voltadas efetivamente para a população de baixa renda. “No mundo inteiro a habitação social depende de subsídios governamentais”.
Segundo o vereador Nabil Bonduki, o plano se limita a estabelecer as faixas de renda, e cabe à prefeitura, por meio da Secretaria da Habitação, traçar uma política que dê conta de atingir as camadas mais pobres da população, usando, entre outros, recursos do programa federal Minha Casa Minha Vida.
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