Antigo Moinho Santo Antônio vai virar campus universitário; veja o projeto
03/06/14 17:25Mais de duas décadas depois do Sesc Pompeia de Lina Bo Bardi, São Paulo terá uma nova grande intervenção arquitetônica em edifício industrial histórico.
Se trata de um projeto do escritório Vidal & Sant’Anna para a FAM (Faculdade das Américas), que vai instalar seu novo campus no prédio do antigo moinho de trigo Minetti Gamba, na Mooca. O conjunto de fábrica e armazéns construídos na primeira década do século passado ficou conhecido pelos paulistanos como Moinho Santo Antônio, nome da casa de eventos que funcionou ali até 2011.
O projeto que tramita hoje na prefeitura cria dois edifícios de vidro, com cinco andares cada, nos limites laterais do terreno. Novas estruturas também serão construídas no subsolo.
Dezoito fotos de perspectivas ilustradas do projeto (obtidas no processo protocolado no Conpresp, orgão do patrimônio histórico municipal) podem ser vistas na galeria abaixo.
Projeto de campus no antigo moinho
Um dos pontos controversos da proposta da FAM é o uso de vidros espelhados na fachada, como uma maneira de “neutralizar” os novos edifícios. A solução foi questionado pelo Conpresp. A justificativa dada ao órgão municipal, que ainda não emitiu seu parecer, foi que “as superfícies espelhadas […] têm como objetivo refletir a imagem dos galpões existentes, reproduzindo a continuidade destes”.
O projeto também propõe que a plataforma da estação Mooca da CPTM seja levada à rua Borges de Figueiredo, com acesso dentro do campus. De acordo com o projeto arquitetônico, a ideia é diminuir a geração de tráfego local e criar convívio público dentro do campus, “dando vida e integração urbana ao projeto”.
Para a estação ser deslocada, no entanto, é preciso o aval da CPTM.
Como uma espécie de contrapartida aos moradores do bairro, a faculdade pretende criar dentro do edifício mais alto, onde ficava o moinho em si, um espaço de exposições de memórias da Mooca, gerido por um conselho de representantes do bairro, da universidade e do centro universitário.
Mas a contrapartida oferecida está muito aquém do que sonham moradores para o lugar. Elizabeth Florido, 44, que já venceu algumas brigas pelo patrimônio da região –uma delas contra a demolição do antigo Cotonifício Crespi, outra contra a construção de um condomínio no próprio conjunto do moinho e que culminou com o tombamento- quer que o lugar seja todo destinado à comunidade.
“O moinho tornou-se um acessório, um enfeite. Como fizeram com a fábrica de açúcar União, onde sobrou só uma chaminé que não diz nada. Vira um brinquedinho de luxo, um enfeite dos prédios. Nós queríamos um espaço real de convívio, como um Sesc”.
Elizabeth também teme o trânsito que será gerado por uma nova faculdade. Há nas imediações dois outros campi: o da Universidades São Judas e o da Anhembi Morumbi. “Vai ser aquela loucura: flanelinha, excesso de veículos, violência”.
A presidente da associação de moradores Amo a Mooca, Dona Crescenza Giannoccaro, 70, também receia o excesso de trânsito. Mas a principal queixa dela é a falta de comunicação com os moradores: “não ficamos sabendo de nada”. Para Dona Zina, como é conhecida, o ideal é que o lugar tivesse uso público, mas diz que também pode ser “interessante” que estudantes ocupem o lugar e conheçam a história do bairro.
O órgão técnico do Conpresp, o DPH, formulou há alguns anos um projeto que transformava o moinho em um centro cultural, a pedido gestão José Serra. Mas a desapropriação do lugar nunca ocorreu.
Para a presidente do Conpresp, Nádia Somekh, “o uso como faculdade vai trazer pessoas de todos os cantos da cidade”, o que ajuda a divulgar o patrimônio industrial que existe na região. “Centro cultural não é a única forma de fazer preservação de patrimônio”.
Opinião semelhante sobre o uso proposto tem o crítico de arquitetura e editor da revista Monolito, Fernando Serapião.
“É um avanço imaginar sobrevida [naqueles edifícios] com estudantes, deixando para trás a ideia de que todo prédio antigo torne-se um centro cultural. Também é positiva a manutenção, principalmente a partir da visão do observador, da imagem fabril na memória do bairro. Contudo, o diálogo entre as novas construções e as antigas é a chave do projeto: se o desenho, no todo e na parte, não for sensível a esse encontro, o conjunto ficará prejudicado”.
Para o arquiteto especializado em patrimônio histórico e professor da FIAM-FAAM Alexandre Franco Martins, as regras do Conpresp limitaram as possibilidades do projeto.
“Para este imóvel, onde havia grandes silos verticais compondo com o edifício horizontal do moinho e que marcavam sua presença na vizinhança, a limitação de altura [30 metros] imposta pelo tombamento impede um projeto que recrie essa relação. Uma torre no mesmo local e com as mesmas proporções dos volumes desaparecidos poderia, além de preservar integralmente os galpões existentes, restabelecer a condição daquele conjunto como referencial na paisagem urbana.”
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